DEUS COMO ELE É

     Vários anos atrás eu tocava bateria em uma igreja. Em um dos ensaios o responsável pelo trabalho tomou uma atitude que bagunçou tudo. Ninguém do grupo achou isso uma boa idéia e eu argumentei com o líder. Nos indispomos,  idéia dele foi mantida e deu tudo errado. Saí indignado, e cuspindo marimbondos. Saindo de lá, minha esposa e eu fomos comer uma pizza com outro integrante do grupo e conversamos a respeito. Eles cobraram outra atitude da minha parte e isso me irritou ainda mais. Perguntei em tom irônico se eles concordavam com o cidadão mesmo que tudo tenha dado errado. Aí veio uma resposta dada por minha esposa que me atingiu como uma chibata. Ela disse algo assim: ”Você está certo quanto ao que houve, mas errado na maneira de agir. Não adianta ficar discutindo e querendo mudar a opinião de quem não quer ouvir. Aprenda uma coisa. Você não tem  poder de mudar ninguém; só a si mesmo”. Detestei ouvir aquilo, ainda mais em um momento de raiva, mas foi uma lição que aprendi. Não podemos mudar ninguém.

Por que contei esse episódio? Simplesmente porque a tendência do ser humano é querer que o mundo seja como ele quer. Eu gostaria que o mundo e a vida fosse da forma que eu penso. Acredito que você também seja assim. Mas tenho uma má notícia para todos nós. A vida é como ela é e ponto final. E da mesma forma que o homem tenta mudar o mundo, e algumas coisas realmente são mudadas, ele também tenta mudar Deus. Não é mais Deus que criou o homem; agora é o homem que cria Deus da forma que melhor lhe convenha. Isso não é nenhuma novidade, pois é algo que já ocorre a milênios. Olhando para o cristianismo, percebemos que essa é uma tendência que cativa cada vez mais pessoas.

Durante muito tempo, principalmente na idade média, a igreja exercia um poder extremamente forte em toda a sociedade. Até mesmo os reis e imperadores curvavam-se diante do papa. A ciência foi calada em suas descobertas, hereges queimados e a palavra da igreja e suas leis eram a verdade inquestionável. Até daria certo se o homem vivesse a lei de Deus, mas a lei que estava sendo imposta, era a lei da igreja que não passava de um esboço mal feito da lei divina. Com o passar do tempo a igreja começou a enfraquecer e sua influência política começa a ruir. Um duro golpe foi a reforma protestante em 1517 Toda a sociedade foi se transformando, e aos poucos nascia o iluminismo. A ciência, livre da opressão religiosa começa a prosperar e o centro do universo passa a ser o próprio homem. Veio a era moderna onde se entendia que o homem é auto suficiente, e através de seu conhecimento todos os problemas seriam resolvidos e a sociedade estaria rumo à tão sonhada felicidade. O homem não precisava mais de Deus, mas esse sonho começou a ser desfeito com a 1ª Guerra Mundial. O homem, que, achava que estava evoluindo e construindo uma sociedade melhor, é confrontado com a idéia da guerra que foi causada por si mesmo. O castelo de areia da era moderna veio a ruir definitivamente com a 2ª Guerra Mundial quando o homem se deu conta que ele também não conseguiu responder aos próprios anseios. Se antes a igreja era o centro do universo, agora o homem e sua ciência o são, mas ambos falharam em sua missão. Aos poucos surge outro pensamento, o pós-modernismo. A principal característica dessa forma do homem pensar, é que não há absolutos. Tudo é relativo; o que é uma verdade para você, não necessariamente é para mim. Novamente o homem é o centro da vida, mas sem nada ou ninguém para moldar seu pensamento. É a era do politicamente correto. Nós todos, do mundo dito civilizado, vivemos essa realidade. Alguns mais, outros talvez menos, mas nascemos nessa realidade e o mundo que existe ao nosso redor foi construído sobre esse pensamento. Todos nós temos, em grau maior ou menor, uma base do pensamento pós moderno na forma de viver. Agora que temos uma noção um pouco melhor da base do pensamento humano, quero perguntar: onde fica Deus nisso tudo? Se tudo é relativo, Deus não foge à regra; ele também o é. Ele passou de absoluto, ao relativo. É nesse ponto que cada pessoa que se considera cristão deve fazer uma reflexão. Quem e como é Deus para mim?

Para muitos o cristianismo é uma religião. Para outros é uma ideologia ou uma filosofia de vida. Mas para o cristão, é, ou ao menos deveria ser, a forma que o Criador quer que cada ser humano viva. É muito mais do que um compêndio de leis a serem seguidas, ou um código de moral e ética. Trata-se da vontade de Deus para cada indivíduo. É claro que não se pode esperar que alguém que não professe a fé cristã compartilhe desse pensamento. Mas como nesse blog levantamos questões acerca do cristianismo, é bastante razoável que sigamos nessa linha de pensamento.

No segundo capítulo da carta que o apóstolo Paulo escreveu aos cristãos da cidade de Colossos, encontramos um fragmento, dos versículos 8 ao 15, no qual há claras advertências aos falsos ensinos que haviam se instalado naquela igreja. Quero citar somente o versículo 8:

 “Cuidado que ninguém vos venha a redar com sua filosofia e vãs sutilezas, conforme a tradição dos homens, conforme os rudimentos do mundo e não de Cristo”.

A igreja dos colossenses vivia uma realidade similar a nossa. Vários ensinos falsos haviam contaminado o evangelho de Cristo. Acreditava-se que outras divindades e espíritos poderiam beneficiar o homem. Vivia-se um certo sincretismo religioso. Mesmo sendo de uma forma diferente que nos nossos dias, mas o evangelho foi relativizado. Mas Paulo, como apóstolo designado por Deus para edificar a igreja, acaba sabendo do que estava acontecendo em Colossos e envia uma carta relembrando alguns ensinos e princípios da palavra de Deus.

Lendo esse versículo não é difícil imaginar que podemos aplicar a advertência nele contida para a maioria dos cristãos da atualidade. Ao que parece, a igreja perdeu seu poder de impactar o mundo e creio que um dos motivos seja que relativamente poucos vivem o verdadeiro evangelho. Fruto de uma sociedade que relativiza os absolutos, o evangelho foi bombardeado por pensamentos humanistas que o desvirtuaram. Como citei anteriormente, o homem tenta mudar o mundo conforme lhe é cômodo. A natureza é devastada para que tenhamos uma vida mais confortável. Leis e princípios são mudados simplesmente por ser mais cômodo, e a mesma coisa é feita com Deus. Ou melhor, tenta-se fazer a mesma coisa com Deus. Mas Deus não é quem o homem pensa ser, mas é quem é e ponto final. Nada do que possamos pensar ou querer em relação a Deus, vai mudar esse fato. Por exemplo: o senso comum entende que Deus não vai mandar ninguém para o inferno, afinal ele é amor e sendo assim isso não faria sentido; ele não iria castigar eternamente a quem tanto ama. Seguindo o entendimento que o homem tem da vida, isso pode até fazer certo sentido, mas lamento lhe informar que não é o entendimento ou a lógica humana que rege o universo. Se não conseguimos acabar com algo tão simples como a fome no mundo, é só dividirmos os alimentos de forma mais justa, como temos a petulância de querer ensinar Deus a administrar o universo? Me perdoe mas, a meu ver, é uma forma de pensamento simplesmente patética. Ao invés de entender e aceitar a idéia que fomos criados a imagem e semelhança de Deus, tentamos criar um Deus a nossa imagem e semelhança.

Ao que parece, hoje em dia a igreja transformou-se em um supermercado ou em centro de lazer ou talvez em um banco, onde as pessoas vão em busca daquilo que querem. Alguns querem sentir-se bem, outros um momento de “terapia” para sentirem-se melhor, outros querem dar uma agitada com um som que acham legalzinho e muitos vão em busca de outros benefícios, principalmente dinheiro e curas. Quando a coisa não acontece, simplesmente se vai a outro endereço onde há mais poder e unção. Parece que a grande minoria realmente está em busca de Deus. Dessa forma fica difícil contestar a imagem negativa que a igreja vem deixando na sociedade, pelo menos em nosso país. Talvez a maioria dos que estejam lendo esse texto concordem com o que penso, mas quero perguntar novamente. Quem é Deus para mim e para você? Como vivemos nosso cristianismo? Estamos inseridos nessa verdadeira “Torre de Babel Gospel”, que mais parece um circo. Rimos, pulamos, gritamos e talvez até choramos. Mas o que nos leva a ter essas reações? Deus é o que ele é e pronto. A discordância de algo, ou a certeza que muitos tem que Deus não existe não muda os fatos. Deus existiria e seria da forma que é, mesmo que a ciência viesse provar o contrário, pois a própria ciência não passa de uma teoria.

Fico seriamente preocupado quando vejo como muitos cristãos estão sendo influenciados pelo pensamento da sociedade. Há um clamor para que a igreja se abra, se modernize e seja mais contextualizada com a realidade. Concordo plenamente com isso, tanto é que o TCC da minha graduação foi sobre esse conceito. Mas uma coisa é negociar tradições ou usos e costumes; outra é abrir mão de princípios divinos apenas para agradar a sociedade ou para que o evangelho seja mais cômodo. A igreja vem se tornando um verdadeiro Judas que vendeu um bem precioso por poucas moedas. A filosofia humana da aceitação de tudo e de todos, da relativização e do conceito do politicamente correto vem assolando a igreja como ondas de uma tempestade que castigam o casco de um barco. Se o barco não for forte o suficiente a situação torna-se insustentável. Fico abismado quando vejo colegas que professam a fé cristã, defendendo sem o menor problema, questões como legalização das drogas e do aborto. Há casos muito específicos onde essas questões merecem uma discussão, mas os argumentos apresentados são de que se tratam de uma questão de saúde pública, ou que, no caso das drogas, acabaria com o trafico. Pode até ser, mas tenho certa dificuldade em imaginar que, perdendo seus negócios, os traficantes fariam cursos profissionalizantes e procurariam uma atividade legal. Daqui a pouco estaremos legalizando assaltos, seqüestros e até assassinatos. Cheguei a ouvir justificativas que afirmavam que não podemos “meter a religião” em todas as questões da vida. Isso não me surpreenderia se não viesse de uma pessoa que era da mesma igreja que eu. Mas concordo; não devemos “meter” a religião em tudo, mas sim avaliar todas as nossas atitudes, pensamentos e decisões com os olhos de Deus. Mas o que se faz, é olhar com os olhos da sociedade, e se houver um confronto com os princípios de Deus, muda-se Deus e pronto. Mudam-se os princípios de Deus, mas não os dos homens. Será que isso é cristianismo?

     “Cuidado para que ninguém vos venha a enredar com sua filosofia e vãs sutilezas...”.

Parece que em poucos momentos da história humana essa palavra faz tanto sentido como agora. Para viver  da forma que o sistema quer, gastamos cada vez mais nosso tempo e recursos em coisas vãs. Abrimos mão da própria vida para correr atrás de sonhos que nem sonhamos. Não temos mais tempo de buscar a Deus e saber o que ele quer de nós. Quando o fazemos, ouvimos pessoas nos instruindo sabe lá de que forma. Engolimos tudo o que ouvimos a respeito de Deus e esquecemos de confrontar a palavra do “grande homem de Deus” com a Bíblia. É imprescindível que conheçamos Deus, e aquilo que ele quer de mim e de você. A forma mais segura para conhecermos a Deus é estudando a Bíblia. Não se acomode conhecendo Deus pela boca de outros. Jó que foi justo e temente a Deus disse:

“Antes eu te conhecia de ouvir falar, mas agora de contigo andar”.

Ninguém é obrigado a seguir o cristianismo. É o que Deus quer, mas ele não obriga ninguém. Quando os discípulos de Cristo lhe disseram que suas  palavras eram muito duras, ele lhes  respondeu dizendo que se quisessem poderiam ir embora. Não eram obrigados a segui-lo. Mas quem o seguisse, deveria fazê-lo de forma integral, buscando viver o que o evangelho prega e não o que o entendimento humano pensa.

Para encerrar, quero relatar um acontecimento que exemplifica muito bem isso. Alexandre “O Grande”, estava em mais uma de suas batalhas quando um dos soldados desertou. Ele foi trazido à presença do Imperador que lhe perguntou: – Qual o seu nome, meu filho? Cabisbaixo e constrangido, o desertor responde: – Meu nome é Alexandre. Sem pensar muito, o Imperador lhe diz: – Deixe me dizer uma coisa: ou você muda de atitude ou de nome. Assim também é com aqueles que se dizem cristãos mas que querem moldar sua fé ao sistema ou ao  que lhes parece mais adequado. Mudam de atitude, ou deixam de carregar o nome de Cristo. Deus é o que é e não negocia sua palavra.

 

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