ENGANADOS E ENGANADORES

     Uma das minhas características é ser questionador. Tenho que cuidar para não exagerar, mas acho que ser crítico é fundamental para que encontremos o equilíbrio, além de nos fazer crescer e até mesmo nos libertar. Acho que às vezes eu exagero, pois minha esposa diz que sou chato. Essa é uma das coisas que eu questiono. Não sou tanto assim; talvez ela não me compreenda.

     Brincadeiras à parte, acredito que seja importante questionarmos as informações que recebemos. Vivemos em uma época absurdamente dinâmica, onde o conhecimento e as informações se multiplicam de forma jamais vista. A palestrante internacional Leila Navarro fez um estudo sobre a informação e constatou que o conhecimento humano tem crescido em uma escala assustadora e jamais vista. O conhecimento humano dobra a cada 3 anos, e a perspectiva é que à partir de 2020 dobrará a cada 73 dias. Isso chega a ser praticamente inimaginável. Imagine que atualmente, em apenas 3 anos o homem adquire a mesma quantidade de conhecimento que obteve nos milhares de anos de sua existência. Atualmente, uma criança de 7 anos tem  a mesma quantidade de informações que os imperadores romanos adquiriam em toda sua vida. Esses dados nos deixam perplexos. Isso abre um leque muito grande no desenvolvimento da humanidade. Mas será que isso é bom?

     Como em tudo na vida, há os aspectos positivos e negativos nessa realidade. O positivo é que o homem é cada vez mais conhecedor do que está  a sua volta e tem mais ferramentas para construir uma realidade melhor. Entre os aspectos negativos, quero citar dois: recebemos muitas informações, mas qual a fonte delas? elas são fidedignas para que amparemos nossa vida nelas? Como dizem, o papel aceita qualquer coisa; há muitas informações que simplesmente são invenções, ou produto de uma mente vazia. O outro aspecto negativo é que recebemos tantas informações que não temos tempo para processá-las. Simplesmente “engolimos” tudo que vemos e ouvimos sem muito senso crítico.  É constatado que a atual geração apresenta uma grande dificuldade em leituras com conteúdo mais denso. O que lemos e vemos deve ser rápido, dinâmico e de fácil absorção, afinal, a fila anda. É fácil perceber que atualmente o homem é bombardeado de informações, conhecimentos, mas os pensadores são cada vez mais raros. É só nos aprofundarmos um pouco em algum assunto e veremos o conhecimento aguado da maioria das pessoas. O homem está se transformando em um mero repetidor de informações, e algumas vezes nem ao menos sabe o que está repetindo. Isso acontece em todas as áreas da vida, e infelizmente a espiritualidade não está fora dessa realidade.

     É comum vermos as igrejas cheias de pessoas que não pensam mais. Seguem quase que cegamente o que é pregado no púlpito. É claro que a vida cristã requer um compromisso e uma disciplina e não pode ser vivida como nós queremos, mas sim dentro dos preceitos estabelecidos por Deus. Se nos dizemos cristãos e discípulos de Cristo, devemos seguir seus ensinos. Mas aí que está nossa questão: quais são seus ensinos? O fato é que nas igrejas se ensina muita coisa que não encontramos na Bíblia e como a grande maioria das pessoas não consegue mais construir um senso crítico, a palavra do pastor  acaba sendo aceita como verdade divina  e inquestionável sem ao menos ser avaliada à luz da Bíblia. E quando é avaliada, é feito de forma errada pois a minoria sabe ler a Bíblia. Esse ensino, muitas vezes errado que recebemos acaba sendo reproduzido, formando novos discípulos de um falso ensino. Talvez você possa achar isso exagerado. Realmente corro o risco de exagerar em minha avaliação, mas vejo situações dessas quase que diariamente.

     Temos que tomar cuidado quando um pastor ou líder centraliza a liderança de uma igreja. Quando o nome do pastor se funde com a própria placa da igreja há um sério risco. O abuso da autoridade, mesmo sendo espiritual, é uma das causas do falso ensino. Em um culto presenciei um pastor afirmando que ele era a voz do Espírito Santo na vida dos fiéis e que estes deveriam obedecê-lo. Concordo que o pastor tem certa autoridade espiritual sobre os fieis, mas no sentido de orientar e não ordenando o que deve ou não ser feito. A questão é que, se o pastor, ou outro líder é a voz do Espírito Santo para minha vida, isso significa que eu não tenho o Espírito Santo, ou que ele não fala a meu coração? Essa idéia se aproxima muito da realidade de um intermediador entre os homens e Deus, como é por exemplo, no judaísmo. Esse é apenas um dos exemplos de ensinos faltos.

     Uma das estratégias que pastores usam para manter sua autoridade intocada, é supervalorizar seu status, citando versículos descontextualizados e chavões como “Ai daquele que tocar no ungido do Senhor”. Com ameaças até mesmo de maldições, ensinam o que bem entendem, e a grande maioria das pessoas crê passivamente no evangelho daquele pastor e às vezes nem conhece o evangelho do Senhor. Ensina-se absurdos tais como: há uma determinada roupa que deve ser usada para ir à igreja, há um estilo musical que agrada mais a Deus, que o shofar é um instrumento que atrai a presença do Espírito Santo, que tudo que há no “mundo” é mau, que não podemos ter amigos não cristãos, e absurdos ainda maiores tais como que o estudo da palavra diminui a fé, que o cristão não pode se divertir com esportes, música ou mesmo indo a uma praia e por aí vai. Outro ensino muito comum é aquele que vincula bênçãos divinas , curas e milagres ao dízimo e ofertas. Ouve-se de tudo.

     Talvez você e eu não creiamos nesses exemplo que citei, mas será que temos avaliado de forma crítica o que ouvimos dos púlpitos? Ultimamente vejo belas pregações, discurso convincentes que provocam choro, arrepios e motivação pessoal.  Mas é isso que a palavra de Deus provoca? Onde está o arrependimento, transformação de vidas, santificação e geração de frutos? Em Colossenses 2 vemos dois versículos muito interessantes. O versículo 4 diz: “Eu (Paulo) lhes digo isso para que ninguém os engane com argumentos que só parecem convincentes”. Já no 8 lemos: “Tenham cuidado para que ninguém os escravize a filosofias vãs e enganosas, que se fundamentam nas tradições humanas e nos preceitos elementares deste mundo, e não em Cristo”. Esses versículos dizem tudo. O apóstolo Paulo pede para que tenhamos cuidado para não sermos escravizados por filosofias vãs e as tradições humanas. Quantas coisas que se fala por aí são baseadas em tradições da igreja? Se começarmos a ter uma visão mais crítica, veremos que é muito mais do que imaginamos e até mesmo aqueles mais esclarecidos acabam sendo enganados. Mais uma vez Paulo ensina que o cristianismo deve ser baseado em Cristo. Um dos chavões mais usados nas igrejas é que Cristo liberta. Concordo plenamente com isso, pois Cristo nos liberta inclusive do falso ensino e das enganações.

     De uma forma geral, a sociedade secular vê os evangélicos como alienados e descontextualizados do restante da sociedade. Em alguns casos até mesmo burros. Será que os evangélicos dão motivo para causar essa impressão? Sinceramente tenho certa dificuldade com pessoas que seguem cegamente alguém. Até mesmo Paulo, o maior apóstolo e teólogo da história pediu que as pessoas não cressem cegamente em seus discursos e que suas palavras sejam examinadas à luz da palavra de Deus. Em Atos 17,10-12 vemos que isso era praticado pela igreja de Beréia. Temos que tomar muito cuidado com líderes que não admitem ser questionados quanto ao que ensinam.

     O cristianismo, como o próprio nome diz, é baseado no ensino de Cristo. Que tipo de cristianismo temos aprendido e vivido? Que tipo de ensino temos passado adiante? Você tem o costume de avaliar o que aprende na igreja, mesmo que aquilo que ouve lhe pareça lógico? Veja que Colossenses 2,4 afirma que os falsos ensinos são convincentes. Quando há o ensino de heresias temos dois personagens. O Enganador e o enganado. Ambos tem sua responsabilidade. O enganado permite que seja enganado. O grande problema é que o ele acaba reproduzindo o ensino e passa a ser um novo enganador. É comum criticarmos duramente o líder que engana, mas a vítima também tem sua responsabilidade. Como discípulos de Cristo temos a obrigação de avaliar o que aprendemos através do que a palavra de Deus diz. Isso é muito mais do que só conferir o versículo que está sendo lido. Compare o que é dito com tudo o que a Bíblia ensina sobre aquele tema. Leia a Bíblia, aprenda a estudá-la, caso contrário você pode ser um dos fantoches nas mãos dos enganadores.

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