Quando eu digo que Calvino não era calvinista, muitos não entendem, porém, com uma lida básica em seus escritos você vai perceber que ele divergia muito da teologia calvinista atual. Muito do que conhecemos hoje evoluiu com o tempo, distanciando-se bastante dos seus ensinos originais, sendo que um dos conceitos que Calvino não apoiava era a expiação limitada.
A expiação limitada é um dos pontos que os calvinistas chamam de TULIP, que é um acróstico contendo suas principais visões teológicas. E prega que a morte de Cristo na cruz não foi por todos e sim, apenas pelos eleitos (MCGRATH, 2014, p. 534) e um dos versículos mais usados para justificar esta teoria é Romanos 5:15:
“Entretanto, não há comparação entre a dádiva e a transgressão. Pois se muitos morreram por causa da transgressão de um só, muito mais a graça de Deus, isto é, a dádiva pela graça de um só homem, Jesus Cristo, transbordou para muitos!” (NVI).
Segundo estes, Cristo não morreu por todos, mas por muitos, e existe também inúmeros versículos, que o texto usa a palavra “muitos” em grego “polus” (Mateus 20:28, 26:28; Hebreus 9:28).
Ou seja, a graça de Deus transbordou a “muitos” e não todos, logo, segundo estes, Cristo morreu por alguns e estes versículos justificaria a expiação limitada.
O grande problema de comprar estas ideias, é que o texto também usa o termo “muitos” para falar da transgressão de Adão, como fica claro no começo do texto:
“Pois se muitos morreram por causa da transgressão de um só”.
Se muitos são alguns, então nem todos caíram no pecado, pois a mesma palavra (polus), é usada para explicar que muitos morreram e depois, que muitos foram tocados pela graça de Cristo.
Este texto não justifica a expiação limitada, na verdade é um erro usar este texto, como fica bem claro quando olhamos para ele como um todo. Calvino explica muito bem está passagem em seu comentário de Romanos:
“É evidente que os ‘muitos’ […] incluem aqueles conectados com os dois partidos os muitos descendentes de Adão e os muitos crentes em Cristo. […] Não pode haver dúvida de que toda a raça humana está implícita nem caso; e há alguma razão por que toda a raça humana não deve ser incluída na segunda?” (CALVINO, 2014, p. 224).
O texto é claro, muitos (todos) morreram por causa de Adão, e através de Cristo a graça transbordou a muitos (todos). Alguns teólogos vão acusar Calvino de universalista. Porém, resumindo o que ele quis afirmar é que Cristo morreu por todos, mas somente os eleitos serão salvos. A eleição é um fator importante para entender a expiação limitada, no ponto de vista dele. Logo, Calvino não acreditava na expiação limitada, porém, a base da doutrina da expiação vinha dele. Já que Jesus havia morrido por todos, mas só os predestinados seriam salvos. A extensão da salvação era universal, mas o alcance não, segundo Calvino é claro.
Penso ser complicado sustentar a visão da expiação limitada, pois os textos são claros. Cristo morreu por todos, e Calvino acreditava nisto, ele sabia que Cristo havia morrido por todos. A expiação limitada para Calvino não era coerente, porem, ele acreditava na predestinação, que de uma maneira ou de outra limitava a expiação divina.
Calvino não explicou muita coisa que calvinistas explicam. Não teve a audácia de explicar nem mesmo a predestinação, usando-a apenas para explicar porque alguns se convertiam com a pregação e outros não:
“Em certo ponto, ao escrever sobre a predestinação, Calvino parece referir-se a ela como um horrível decreto” (MCGRATH, 2014, p. 533).
Acredito que Calvino tenha razão, certas coisas são mistérios divinos e entender plenamente alguns conceitos é impossível
Eu acredito tal qual Calvino, que Deus morreu por todos, mas apenas aquele que crê é que será salvo. O alcance de sua morte foi universal, mas só faz efeito naquele que crê.
BIBLIOGRAFIA
MCGRATH, Alister. Teologia Sistemática, Histórica e Filosófica: Uma introdução a Teologia Cristã. São Paulo: Shedd Publicação, 2014.
CALVINO, João. Romanos. São Paulo: Fiel Editora, 2014.
