Por muito tempo eu trabalhei em indústria, foi por conta dela que eu consegui estudar, fazer uma faculdade e passar para níveis mais administrativos. Sou grato a Deus pelo tempo que eu passei neste setor.
Um trabalhador que atua em níveis mais operacionais normalmente é chamado de um trabalhador de chão de fábrica. Por conta deste rótulo, ou talvez pela posição que tal profissional possui na fábrica, muitas vezes ele é alvo de escárnio e preconceito por quem trabalha em níveis administrativos, como se trabalhar no chão de fábrica fosse pouco, e de pouca importância. Mal sabem estes que se uma empresa não tiver bons produtos, de nada adiantará bons vendedores, ótimos administradores ou bons gerentes, pois o que sustenta uma empresa é justamente o seu produto sendo que quem fabrica é o chão de fábrica. A pergunta que talvez vocês devam estar se fazendo é: Qual é a relação entre indústria e teologia na pós-modernidade?
Quando falamos dos Desafios da Teologia na Pós-Modernidade falamos muito de chão de fábrica, pois é impossível fazer com que a nossa teologia faça o mínimo de coerência se antes não tivermos uma boa base, um bom chão de fábrica para que assim a teologia tenha um fundamento firme no qual possamos nos sustentar. Tudo começa com o fundamento, com um bom alicerce que estrutura a teologia toda, e é sobre estes alicerces que vou discorrer enquanto eu falo sobre estes desafios.
O primeiro desafio no qual devemos estar preparados é o relativismo. Que defende que não existe verdade absoluta, as opiniões vão depender dos pontos de vista, ganha quem conseguir impor a sua forma de pensar. O problema do relativismo é que ele se auto desconstrói, afinal, se a verdade é relativa, até o relativismo é relativo. Isso sem contar que segundo a lei da não contradição, uma afirmação contraditória não pode ser verdade ao mesmo tempo. Contudo o cerne da questão não é só refutar apenas e sim, como dialogar de uma forma no qual possamos construir pontes ao invés de muros, é um problema quando ganharmos uma discussão e perdermos uma pessoa.
O segundo desafio é a pós-verdade, que nada mais é que um discurso baseado em um apelo a emoções em detrimento dos fatos ou da verdade objetiva, e este tipo de discurso é muito comum em nossos dias. Com isso é quase impossível realizarmos um diálogo, pois o interlocutor não discute tendo como base as provas, o racional ou o lógico e sim tendo como base a emoção e a falta de reflexão. Gosto de uma citação de Heráclito sobre o assunto, que eu li em um livro do Bertrand Russel:
“Os tolos, quando de fato ouvem, são como os surdos; a eles se aplica o ditado de que estão ausentes quando presentes” (RUSSEL, 2017, p. 29).
Dialogar tendo como pressuposto a emoção ao invés da razão é um problema, pois os argumentos nunca serão sólidos, com provas e boas reflexões, sendo que muitas vezes este tipo de pessoa nem ouve, o que traz um desafio ainda maior para quem faz teologia.
O terceiro desafio é dialogar com uma geração que não tem conteúdo, que preza pelo instantâneo e não tem tempo de pesquisar, ler e se aprofundar. A busca pelo conhecimento foi substituída pela opinião que mais se encaixa em nosso modo de ver as coisas. Com isso ninguém cresce, ninguém reflete, todos seguem a correnteza de forma automática e sem reflexão. Uma frase atribuída a Sócrates resume bem este nosso desafio:
“Uma vida sem reflexão não vale a pena ser vivida” (KLEINMAN, 2014, 12).
Sem reflexão seguiremos no automático, aceitando qualquer ponto de vista, seguiremos a correnteza rumo a lugar nenhum.
Diante destes fatos é imprescindível que o nosso alicerce esteja calcado em alguns pontos importantes para que consigamos dialogar e fazer diferença, abordarei os três principais
Conhecimento: Pondé fala muito da importância de termos repertório. Sem repertório é impossível fazermos teologia neste mundo pós-moderno. Repertório nada mais é que um acúmulo de bagagem adquirida principalmente com leitura, viagens e conhecimento. Pondé complementa o tema em seu livro Filosofia para corajosos:
“Quem nunca leu nada não tem opinião sólida sobre nada, apenas achismo, uma opinião vazia, como diria Platão, quando fazia a diferença entre ter opinião (doxa) e conhecer algo (episteme). Conhecer demanda trabalho, conversar com outras pessoas e ler alguns livros. Na maioria dos casos, conversar com mortos. Uma opinião vazia, qualquer bêbado tem (PONDÉ, 2016, Pg. 29)”.
A busca pelo conhecimento é essencial para que consigamos dialogar neste mundo pós-moderno. Sem repertório não conseguiremos realizar os desafios, sem este fundamento, certamente veremos o edifício todo ruir diante da tempestade pós-moderna.
Humildade: É imprescindível sermos humildes, sem humildade não existe diálogo, não conseguiremos aprender e crescer. O orgulhoso é cego, só vê a si mesmo, não percebe que o conhecimento é infinito e que para adquirirmos precisamos da lente da humildade.
Ação: Toda esta reflexão seria vazia se junto com todos estes pontos, não viesse à ação. A práxis é utilizar uma teoria ou um conhecimento de forma prática. A práxis é uma teoria que se movimenta, que traz frutos e constrói caminhos. Sem a ação ficaremos a sós no discurso, sem construir algo concreto e que faça realmente diferença.
Estes são apenas alguns desafios para quem quer fazer teologia na pós-modernidade, existem muitos outros, sem contar os que virão.
A saída é sempre manter os olhos abertos e a cabeça em constante busca por aprendizado. Sem reflexão, conhecimento, humildade e diálogo não chegamos em lugar nenhum, sem uma boa base ruiremos. Por isso, estruture bem o seu edifício e faça diferença com a sua teologia.
Bibliografia
KLEINMAN, Paul, Tudo o que você precisa saber sobre filosofia, Editora Gente, São Paulo, 2014.
RUSSEL, Bertrand, História do Pensamento Ocidental, Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 2017.
PONDÉ, Luiz Felipe, Filosofia Para Corajosos, Pense com a própria cabeça, Editora Planeta, São Paulo, 2016.
