Vivi a minha infância em um contexto onde a experiência era muito mais importante que o conhecimento. Na igreja, pastores ungidos, que segundo eles, recebiam a palavra diretamente de Deus, eram levados muito mais a sério do que aqueles que estudavam a Bíblia, e procuravam conhecer cada vez mais as escrituras. Ler livros, estudar a palavra a partir dos textos originais, e gastar tempo para conseguir chegar na melhor e mais fiel interpretação bíblica, não era prioridade. O ungido de Deus não precisava disso. Bastava orar e esperar a revelação chegar.
É comum vermos estes cristãos dividirem a igreja em igrejas do fogo, que experimentam o poder de Deus, e igrejas frias, que não experimentam a ação divina. Tudo porque a experiência fala muito mais alto do que o conhecimento e o estudo. Anselm Grün, no livro “Ser uma pessoa inteira”, acrescenta pontuando que:
“Hoje há uma tendência de descrever a fé apenas como “experiência”. Neste caso se estabelece a experiência como algo absoluto e se recusa a compreendê-la e refletir sobre ela com o intelecto” (GRÜN, 2014, p. 137).
Não tenho o propósito com este texto de desconstruir a experiência de ninguém, muito menos creio que é impossível estes fenômenos acontecerem. Deus fala e age como ele bem quer, final, ele é Deus. O problema é colocar a experiência acima de tudo, e diminuir o estudo, crendo não ser espiritual ou uma prática sem importância.
Primeiramente a nossa fé é com certeza racional, pois crer passa pela mente. Nossas ações, o que acreditamos e professamos, impreterivelmente passa pelo pensamento, por reflexões e pontos de vista. A questão é que alguns pontos de vista possuem mais base bíblica do que outros, mas é imprescindível algum tipo de teologia ou opinião na hora de crer.
Por segundo, que é a parte mais contraditória dessa forma de pensar, é a própria Bíblia. Não vou me ater aos versículos que falam da importância de ler, estudar e meditar na palavra (2 Timóteo 3:15-17; Atos 17:11; Deuteronômio 6:5-9; João 5:39), são muitos textos que testificam e evidenciam o quão ignorante é afirmar que estudar a Bíblia não é importante. E sim no fato que “se a Bíblia é a palavra de Deus, estudar esta palavra, tentando entender a mensagem nos mínimos detalhes, é um dos atos mais espirituais que podemos fazer”. Afinal, é a palavra do próprio Deus, com isso, entender é saber de forma precisa a sua vontade.
Levar em consideração mais a experiência do que o próprio texto, que é algo palpável e absoluto, é uma atitude muito perigosa. Crer que Deus te deu uma capacidade especial de ler a Bíblia, sem estudar, é no mínimo contraditório, já que a Bíblia aponta para a importância de ler, estudar a examinar as escrituras (Marcos 12:24; Provérbios 3:1-2; Oséias 4:6). A ênfase no estudo está em toda a palavra, e ela nos avisa para não só estudarmos, lermos ou guardarmos seus ensinos, mas também de examinarmos. Foi o que os bereanos fizeram, quando Apóstolo Paulo e Silas, foram a sinagoga pregar. Eles queriam saber se o que estava sendo falado estava na Bíblia (Atos 17:11).
A fé madura é firmada na palavra, acima de qualquer coisa, não dá para ir pela emoção ou somente por ela, é preciso ter base, estudo e fundamento bíblico. A experiencia cristã transforma um momento, um acontecimento, em uma regra, o que é um erro muito grande. É preciso pensar, examinar a Bíblia e refletir, para não cairmos em ensinos errados.
Tudo o que falamos, cremos e seguimos, precisa estar fundamentado na palavra de Deus. Nós não podemos nos guiar por nossas emoções, nem fundamentar nossa vida em experiências. O homem pode se enganar, falar as coisas por impulso, acreditando ser mensagem de Deus, por isso, precisamos tomar muito cuidado, e estar sempre estudando a Bíblia, para não cairmos nestes equívocos.
Buscar o entendimento, procurar entender a fé e a palavra é fundamental. É preciso pontuar e entender no que cremos, esta é a fé madura. Que estuda, entende e pondera. E é claro, a fé madura sabe que muita coisa não dá para explicar, assim como não podemos reduzir a fé a intelecto. Existem experiências que não podemos negar. Mas colocar o intelecto de lado é muito perigoso.
Cuidado com as emoções, aprenda a não reduzir a sua vida a meras experiências. Fundamente a sua vida na palavra, e descubra como é espiritual conhecer a palavra do Criador. Em mergulhar em cada ensino, com o propósito de entender a mensagem e fazer dela uma prática de vida. Isso é uma vida espiritual, o resto é emocionalismo.
BIBLIOGRAFIA
GRÜN, Anselm, Ser uma pessoa inteira, Editora Vozes, Rio de Janeiro, 2014.
