A ODISSEIA DA DOR X: VISÃO ESTREITA

“A dor estreita a visão. Sendo a mais pessoal das sensações, ela nos força a pensar quase que exclusivamente em nós mesmos(YANCEY, 2004, p. 252).

Já reparou como o nosso problema é sempre o mais difícil? Já percebeu o quanto quantificamos os nossos sofrimentos e diminuímos os problemas dos outros? Isso quando não fazemos o oposto, nos comparamos com os outros e agradecemos a Deus por não estarmos naquela situação, em uma espécie de reflexão comparativa, onde o outro é um padrão para a minha vida.  

Como a epígrafe otimamente diz, a dor estreita a visão. A dor nos faz focar apenas em nós e em nossos problemas, nos obrigando a fechar os olhos para todos em volta, como se fossemos únicos, superiores, os mais necessitados.

Não é fácil sofrer, mas entre os meus dias de dificuldades, eu tinha a impressão de que não enxergava mais nada. Era só eu, meu sofrimento e as minhas dificuldades.

Lembre-se que a dor é única, cada um sente da sua forma, é impossível igualar a nossa dor com a do outro. O que é impossível e difícil para você, pode ser tranquilo para o outro e vice-versa. Por isso que ante o caos, temos que ter uma visão ampliada, não podemos nos deixar levar pela cegueira que o caos traz. 

A história de José, descrita em Gênesis, é uma prova da importância de termos um olhar ampliado diante dos problemas. Sendo o filho preferido de Jacó (Gênesis 37:3), José foi alvo da inveja dos irmãos (Gênesis 37:4) e sendo maltratado por eles. Não devia ser fácil nem para José, que não tinha culpa por seu pai tratá-lo de forma diferente, muito menos tinha culpa da inveja dos irmãos. Não dá para cobrar uma atitude assertiva de um adolescente, nem acreditar que ele deveria ter uma visão ampliada da vida. O pai o mimava, já que era o filho preferido, e os irmãos não gostavam disso, uma situação complicada por si só. 

O ódio dos irmãos aumentou quando ele teve alguns sonhos, além de ser bem tratado pelo pai, todos iriam se curvar perante ele. Aquilo foi a gota d’água, José deveria morrer, mas no final, ele foi vendido como escravo pelos irmãos (Gênesis 37:28). De filho preferido e sonhador, José virou escravo. Sua realidade havia mudado da noite para o dia.

Como escravo, ele foi trabalhar na casa de Potifar, que era um oficial da guarda do palácio (Gênesis 39:01). Lá José acabou ganhando a simpatia de Potifar, e terminou tendo uma posição de destaque. Contudo, como acontece a toda a posição de destaque, ele foi alvo da mulher do oficial (Gênesis 39:7), mas José se recusou a se deitar com ela, e depois disso foi acusado de estupro (Gênesis 39:14-20), e foi preso por isso.

Na cadeia, preso de forma injusta, ao invés de reclamar, ele se destacou, conquistou a amizade do carcereiro e acabou virando uma espécie de encarregado dos presos (Gênesis 39:22-23). E lá, enquanto trabalhava, ele interpretou dois sonhos que acabaram acontecendo. Sendo que depois de interpretar, o único pedido que ele fez ao copeiro do rei foi que, quando tivesse seu cargo restituído, lembrasse dele. E ele se lembrou, dois anos depois (Gênesis 40:1-23). Imagine você ajudando alguém e esta pessoa esquecer de você, lembrando apenas dois anos depois, meio que por acidente?

José é um personagem que eu admiro muito, pois, apesar de todos os percalços, parece-me que ele soube lidar com todo o sofrimento. Nos diversos lugares que esteve presente, ele conseguiu transitar e se destacar. Soube olhar adiante, e principalmente, aprendeu a confiar em Deus.

É interessante ler as diversas passagens que diz basicamente a mesma coisa: “O senhor Deus estava com José” (Gênesis 39:2; 39:21; 39:23). Esta era a única certeza de José, ele confiava em Deus, e sabia que no final, apesar de todos os problemas, Deus estava com ele. 

José tinha 17 anos quando todo o caos começou a acontecer (Gênesis 37:2), e tinha 30, quando finalmente virou governador de todo o Egito, conforme o seu próprio sonho (Gênesis 41:46). Foram praticamente 13 anos de sofrimento e percalços, mas José confiava em Deus e sabia olhar em volta. Charles R. Swindoll complementa:

“Por que, então, José foi tão importante? Ele foi importante por causa da sua fé em Deus, que se manifestou em uma atitude magnânima em relação a outros e da sua atitude magnífica diante das dificuldades. Uma fé sólida leva a uma boa atitude” (2000, p. 175-176). 

Quando temos fé em Deus, passamos por qualquer adversidade. É preciso, durante o sofrimento, aprendermos a não enxergar apenas nós, e a nossa situação. É importante termos uma visão ampliada, entendendo que podemos não estar compreendendo todo o sofrimento, mas que também nós não estamos sozinhos, isso é confiar em Deus.

Crer em Deus, não é só motivo de esperança, mas também é a ferramenta que faz com que olhemos em volta, que compreendamos que não somos os únicos a sofrer. A dor, estreita a nossa visão, mas a confiança em Deus, nos faz vermos além do que estamos passando.

O modo como olhamos para as diversas situações da vida, determina a nossa atitude, a nossa paz e como vamos lidar com os percalços. Quando ajustamos a nossa lente, agimos de forma mais assertiva e menos egoísta.

Não é fácil passar por momentos de dor, é claro que não é, contudo, a nossa atitude, vai definir o teor da dor. Às vezes aumentamos ainda mais o sofrimento, por não querermos aceitar a situação, ou mesmo por ficarmos remoendo tudo sem parar.

É preciso aprender a aceitar, e seguir em frente. Não é se entregar para a situação, e sim, aceitar e caminhar, buscando novos motivos, novas formas e novas saídas, confiando sempre no fato que “Deus está conosco”. 

BIBLIOGRAFIA

YANCEY, Philip. Decepcionado com Deus: Três perguntas que ninguém ousa fazer. São Paulo: Editora Mundo Cristão, 2004.

SWINDOLL, Charles, R. José: Um homem íntegro e indulgente. São Paulo:  Editora Mundo Cristão, 2000. 

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