A MEDIOCRIDADE DE OURO

Algumas palavras perdem o seu verdadeiro significado com o tempo. As mudanças da sociedade ou a falta de reflexão levam as pessoas a se esquecerem dos reais significados de alguns termos ou mesmo a ressignificarem algumas expressões. O termo medíocre é um deles.

Entender que estar na média não é algo negativo, nesta sociedade de exageros, é o que menos vemos hoje em dia. Todos querem estar no topo, mas em meio à busca, esquecem de viver o hoje e não entendem como a média é um patamar, na verdade, muito elevado, que poucos conseguem chegar.

No século XVIII, pegando alguns princípios da Antiguidade Clássica, o Arcadismo propôs uma série de lemas que apresentam ideais atemporais interessantes para alguém seguir. Assim sendo, tais lemas valem tanto para nós quanto para as outras gerações (BARROS, 2023, p. 19).

E alguns destes lemas são inutiliza truncat (cortar o que é supérfluo), carpe diem (aproveite o dia), aurea mediocritas (a mediocridade de ouro) e mais alguns lemas bem interessantes, que em um primeiro momento, soam contraditórios e equivocados, mas que são lemas fundamentais.

O significado da palavra medíocre, atualmente, não é nada positivo. Medíocre é algo inferior, sem qualidade, afirmarão muitos. O medíocre é alguém incompetente, que não sabe fazer as coisas e vive de forma equivocada. Estar na média, hoje em dia, é um grande defeito, o homem de sucesso é aquele que busca ficar no topo, segundo a atual ideologia. Com isso, as pessoas anulam a sua vida para conseguir chegar neste patamar. Passam seus dias correndo atrás do sucesso, se esquecendo de viver o hoje. É a chamada tirania da vitória, que estabelece suas normas ao custo da própria paz e da vida, que é limitada.

Não quero afirmar que você não deve se esforçar para conseguir colocar seus planos em ação. Às vezes precisamos renunciar algumas coisas, para conseguirmos avançar mais em nossa carreira ou empreendimento. Eu estou falando apenas da importância do equilíbrio, criticando aqueles discursos motivacionais que pregam o sucesso a qualquer custo. Será que vale a pena abdicar da família, pela carreira ou de um descanso adequado, pelos nossos empreendimentos? Em alguns períodos, eu sei que podemos até abrir algumas exceções, o perigo é fazer das exceções regras.

 A justa medida é uma das importantes regras da cultura grega antiga. Entre as máximas dos sete Sábios, escritas no templo de Delfos, estavam as frases: “A medida é a melhor coisa” e “nada de excessivo”. A primeira atribuída a Cleóbulo e a segunda a Sólon. Estas máximas inspiraram muitos poetas e pensadores, sendo que Platão aprofundou o tema em um nível realmente significativo. E Aristóteles também separou um espaço em sua ética das virtudes para falar do justo meio (ANTISERI; REALE, 2017, p. 244-245). Desde a antiguidade, o equilíbrio era uma prática importante e estar na média o melhor caminho.

A mediocridade de ouro (Aurea mediocritas) fala sobre um meio-termo seguro e aceitavelmente bom. A intenção não é fazer uma apologia à pobreza e sim uma proteção contra a ganância sem medida e a petulância. A falta não é legal, passar por necessidades é realmente prejudicial para a nossa vida, contudo, a ambição desmedida é também um grande problema (BARROS, 2023, p. 42). Daniel Martins de Barros (2023), complementa:

“Aurea mediocritas: a “mediocridade de ouro” valoriza a moderação, o meio-termo, e nos relembra que “medíocre” originalmente significa “o que está no meio””.

Lembre-se daqueles que muitas vezes são sinônimos de sucesso, mas que vivem para o trabalho e o seu empreendimento, sem descansar por um segundo. Ou dos indivíduos que não se contentam nunca, não conseguem estar satisfeitos com nada, querem sempre mais. O capitalismo tem este poder de inculcar nas pessoas a sede por dinheiro. Como se as riquezas fossem tudo na vida.

Estar na média é conseguir chegar em um ponto equilibrado, é aprender a estar satisfeito e não permitir que o excesso seja a sua principal ação. É possível estar satisfeito, aproveitar tudo o que temos e colocar limites importantes para a sanidade mental. Nunca as pessoas tiveram tantas facilidades, mas também tantas doenças, fruto desta falta de equilíbrio.

Construir uma vida equilibrada é um grande desafio, é muito mais fácil seguir os exageros do que o justo meio, por isso que, aqueles que conseguem estar na média, na verdade, não são pessoas fracas ou inferiores, mas indivíduos que entenderam as verdadeiras prioridades da vida e seguiram pelo complexo caminho do meio.

Bibliografia

ANTISERI, Dario.; REALE, Giovanni. Filosofia: Antiguidade e Idade Média. São Paulo: Paulus, 2017.

BARROS, Daniel Martins. Viver é melhor sem ter que ser o melhor: E outros princípios do Arcadismo para os dias de hoje. Rio de Janeiro: Sextante, 2023.

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