DESAFIOS DA ESPIRITUALIDADE CRISTÃ VI: A ESPIRITUALIDADE CRISTÃ E AS EMOÇÕES

Alguns sentimentos são vistos por determinados cristãos como negativos e não bíblicos. E a ira, a tristeza e o medo figuram como os principais. O verdadeiro cristão não tem tais sentimentos, falam estas pessoas.

O problema é quando abrimos a Bíblia e encontramos homens de Deus em momentos de ira, medo ou tristeza. Cristo mesmo se sentiu angustiado um pouco antes de morrer na cruz (Lucas 22:44), Ele também chorou (João 11:35) na frente de todos. Sem contar que temos um livro da Bíblia chamado Lamentações e muitos Salmos de Davi, com lamentos e tristezas de homens de Deus, que não tinham medo de expor suas dores. É fundamental entendermos que tais sentimentos são genuínos, saber gerenciar coerentemente estas emoções, ao invés de escondê-las, é o grande segredo.

Geri Scazzero (2014) no livro Eu desisto, argumenta que hoje as pessoas têm se mostrado analfabetas emocionais, justamente porque não sabem lidar com suas emoções e insistem em se distanciar e até esconder estes genuínos sentimentos.

No fundo, o ser humano hoje tem sentido medo de parecer vulnerável, insuficiente e fraco, entretanto, mascarar tais emoções nos prejudica ainda mais. Somos seres humanos, falíveis e fracos, mas que insistem em se mostrar intocáveis. Aprender a lidar com os nossos sentimentos, na verdade, nos fortalece. E cada uma das emoções aponta para áreas e realidades que precisam ser trabalhadas.

Com uma habilidade incrível, Geri consegue mostrar os lados positivos dos sentimentos vistos como negativos. A ira, por exemplo, revela como, em muitos momentos, alguns limites pessoais podem estar sendo afrontados. E são nestes momentos que o ser humano precisa se autoavaliar e buscar entender quais coisas importantes estão sendo ultrajadas para assim colocar limites (SCAZZERO et al., 2014, p. 97). Geri Scazzero explica que:

“Diz-se que a ira é um “sentimento secundário”. A ira geralmente coexiste com outros sentimentos tais como dor, tristeza, decepção e vergonha. Por isso, explorar essas emoções mais profundas e vulneráveis é essencial para lidar com a ira de modo maduro” (SCAZZERO et al., 2014, p. 98).

Assim sendo, buscar o autoconhecimento para entender quais são as coisas que nos tocam e os limites que muitos ultrapassam é muito importante para aprendermos a agir com sabedoria em um momento de ira.

A tristeza é outro sentimento genuíno que muitos cristãos tentam negar. Mas ficar triste e lamentar não é nada errado. Como afirmei no começo do texto, Salmos e lamentações são livros com desabafos e lamentos. E temos um Deus, que podemos derramar o nosso coração de modo sincero e genuíno.

Por fim, temos o medo, visto por alguns, como um verdadeiro pecado. Mas o medo é um sentimento natural quando estamos em meio ao perigo ou às ameaças, e a Bíblia também fala de muitos profetas e homens de Deus, que sentiram medo, mas seguiram confiando em Deus. Como Moisés, que aos 80 anos precisou enfrentar o Faraó. Davi e o seu embate com Golias em meio a muitos que afirmavam que ele não poderia vencer aquele gigante, entre tantos exemplos que a palavra de Deus nos oferece (SCAZZERO et al., 2014, p. 107).  O nosso desafio é identificá-los e colocar todos nas mãos de Deus para seguirmos a nossa missão. Geri complementa:

“Cada um desses exemplos bíblicos nos ensina que coragem não é ausência do medo. Pelo contrário, é a capacidade de pensar e agir apesar dos nossos medos, é avançar sobre eles por causa de uma visão mais ampla de Deus” (SCAZZERO et al., 2014, p. 108).

Não existe problema algum com o medo, sendo que é possível até termos ações mais cuidadosas, por conta dele. Coragem é agir, apesar do medo, confiando sempre no cuidado de Deus.

Ao meditarmos de forma bem realista sobre estas emoções, constatamos que sentir não é um problema, o problema é paralisar em meio a estes sentimentos. Saber vivenciar tais momentos de modo genuíno, sem ficar ancorado em tais situações, é o grande segredo.

Tudo vai do seu posicionamento e como você trata estas emoções. Não podemos negá-las e muito menos ser paralisados por elas. É possível sentir e seguir, confiando que Deus está caminhando conosco.

Bibliografia

SCAZZERO, Geri.; SCAZZERO, Peter. Eu desisto!: Pare de fingir que está tudo bem e mude de vida. São Paulo: Editora Vida, 2014.

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