O DEUS QUE CHORA

“Jesus chorou…” (Referência: João 11:1-44).

O capítulo começa introduzindo um acontecimento que fez parte da vida de uma família muito fora do padrão. A família em questão era a de Lázaro, irmão de Marta e Maria. Uma família de irmão solteiros que moravam juntos, algo fora do padrão para a época e até para os nossos dias. Normalmente depois de uma certa idade casamos e constituímos família, coisa que o texto dá a entender que eles não fizeram.

O texto diz que Lázaro estava doente (V1), sendo estes irmãos amigos de Cristo, nada mais óbvio que mandar chamá-lo, mas este, ao invés de ir, resolveu demorar-se, pois tinha um propósito com aquele acontecimento, Cristo queria ressuscitar Lázaro (V. 4). Sendo assim por ter-se demorado, Lázaro morreu (V. 13).

É importante ressaltar que segundo a Bíblia Jesus estava sempre na casa destes irmãos (Lucas 10:38-42, Mateus 26:6-13, Marcos 14:3-9, João 11:1-12, 12), a família em questão é uma das mais citadas no Novo Testamento, sendo que ela aparece nos quatro evangelhos, dando-nos a entender que eles estavam sempre com Jesus e que o conheciam muito bem.

Porém o texto diz que quando Cristo chegou à casa deles, já fazia quatro dias que Lázaro havia sido sepultado. E quando Jesus diz que iria ressuscitá-lo, estes irmãos não acreditaram (V. 23). Eles conheciam Jesus, sabiam que era o Messias que deveria vir ao mundo. Já deviam ter o visto fazer milagres, ou pelo menos ouvido falar, mas diante da adversidade, haviam se esquecido de todas estas informações.

O curioso é que nós somos um pouquinho perecidos com estas irmãs, pois diante da adversidade, mesmo que nós sejamos amigos de Jesus, ou saibamos quem Ele é, focamos a nossa atenção muito mais nos problemas do que n’Ele. É muito mais fácil olhar para as adversidades e tentarmos controlar tudo de nossa maneira, terminando por nos desesperarmos quando perdemos o controle. É normal nos sentirmos sozinhos e abandonados, sem perceber que ele sempre está conosco, é comum, diante do caos, esquecermo-nos de quem somos amigos. Com eles foi assim e conosco também é. Precisamos tomar cuidado para que os problemas não nos afastem de Deus ou nos façam esquecer que Ele sempre está conosco.

Contudo, a meu ver, o ponto alto do texto é justamente o que serve de epígrafe para esta reflexão: Jesus chorou (V. 35). O texto em questão é o menor versículo da Bíblia e o mais curioso. Pois ao vermos Cristo próximo a ressuscitar Lázaro não achamos o seu choro uma atitude lógica. E é por conta desta “contradição” que teorias e mais teorias são construídas para explicar o motivo de Jesus chorar.

Uma delas diz que Cristo chorou porque estava fazendo um teatro para causar um efeito, uma certa empatia com os visitantes, porém tal afirmação não combina com o Jesus que lemos nos evangelhos. Outros afirmarão que ele chorou de alegria, contudo, devido o cenário de luto no qual ele se encontrava, não é muito lógico afirmar isso. Tem quem afirme quem o seu choro foi de indignação por conta da incredulidade, o que pode até ter o seu fundo de verdade. Porém a última argumentação diz que Jesus chorou como qualquer ser humano choraria, e é esta interpretação que eu acho mais coerente, afinal, não podemos esquecer que Ele era 100% homem e 100% Deus, com isso, a atitude de empatia ao ver seu amigo morto e seus familiares sofrendo foi algo totalmente natural (CHAMPLIN, 2014, p. 613).

E a nossa reflexão em cima desta passagem se torna ainda mais profunda quando analisamos a palavra em grego, que segundo o dicionário significa:

“Chorar de forma audível” (VINCENT, 2013, p. 168).

Não foi apenas um choro silencioso, uma tristeza qualquer que a dor do luto traz, foi um choro audível, uma tristeza sincera onde todos podiam ver e constatar. O que me faz lembrar de uma passagem do livro “Porque sou cristão” de John Stott:

“O único Deus em quem eu creio é aquele que Nietzsche, filósofo alemão do século 19, ridicularizou, chamando-o de Deus sobre a cruz. No mundo real da dor, como adorar a um Deus que fosse imune a ela?” (STOTT, 2004, Pg. 67).

Servimos a um Deus que sente o que nós sentimos, pois Ele também foi homem. Adoramos a um Deus que entende quando estamos sofrendo preconceito, passando por dores e agonias que uma doença traz ou passando por perseguições e injustiças. Deus nos entende e cuida de nós, Ele não é aquele Deus caricaturado por muitos, sentado em um trono alheio a tudo e a todos. Ele é um Deus que sente, sofre, e não nos abandona.

Quando eu leio este versículo 35 eu fico bem aliviado, não me sinto sozinho em minha dor. Apesar de não entender a profundidade deste Deus, tenho certeza de que Ele nos entende.

Jesus chorou e ainda chora, ele caminha conosco e cuida de nós, sabendo muito bem qual é o timbre de nossa dor. Pois Ele sofreu, morreu e ressuscitou em uma cruz para nos salvar.

Pode ter certeza que mais ninguém entende o timbre da sua dor, pois ela é única, cada um sente de uma maneira. Mas Deus entende e oferece a sua mão, chora com você e te ajuda. Confie neste Deus que chora que te entende e anda com você, Ele não te deixa só, apesar de muitas vezes não o entendermos, e focarmos nossos olhos mais nos problemas do que na solução.

BIBLIOGRAFIA

CHAMPLIN, R. N. O Novo Testamento interpretado Versículo a Versículo, Editora Hagnos, SÃO PAULO, 2014.

VINCENT, Marvin R. Vincent, Estudo do Vocábulo Grego do Novo Testamento, Editora CPAD, Rio de Janeiro, 2013.

STOTT, John. Por Que Sou Cristão, Editora Ultimato, Minas Gerais, 2004.

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