A ODISSEIA DA DOR XIV: DOR BENIGNA

“A dor não é uma mera ilusão, é sintoma da vida. Onde quer que haja vida, haverá dor; onde quer que haja vida, será possível desmascarar o desespero” (BONDER, 2011, p. 13).

Eu descobri como é possível aprender com a dor quando eu era ainda criança, em um episódio que ficou gravado em minha memória a minha vida toda. Meu avô estava soldando alguns equipamentos eletrônicos, sendo que eu muito curioso fiquei a observar. Quando ele saiu, resolvi desobedecê-lo e tocar no ferro de solda, quando obviamente, eu queimo o dedo. Nunca mais esqueci do ocorrido, foi a minha primeira lição, aprendida nos meus primeiros anos de vida. 

Viver é sentir, sendo que este sentir é múltiplo, tem várias facetas, intensidades e gostos. Ele acontece pelo ouvir, quando uma bela música é tocada, também pelo gosto de um saboroso alimento, pela satisfação de conseguir alcançar algo, ou pela dor, que sinaliza que algo não está bem. A dor, que é muito incômoda, é um ótimo sinal, é um aviso que nos faz ir buscar a cura.

Vivemos em um mundo de dor, é completamente impossível viver sem dor. Um filho nasce em meio a dor, uma dor que acaba trazendo alegria, fazendo com que tudo valha a pena. A dor nos avisa quando algo está errado, sendo que a falta dela, é um grande problema. Quem tem hanseníase, que antigamente era conhecida como lepra, tem justamente o problema de não sentir dor, e com isso, mutilam partes do corpo sem perceber, ou morrem de problemas que são possíveis de se resolver quando uma pessoa consegue sentir dor, como por exemplo a apendicite. Um mundo sem dor não é só infeliz, mas impossível. Sentir dor faz parte da vida, aprender com a dor é a atitude de quem é inteligente.

Eu sei que nem sempre conseguimos entender a dor, em alguns momentos ela chega para tirar toda a explicação e a coerência. Mas podemos crescer com ela, é possível desde aprendermos com a situação até sermos mais empáticos por conta dela.

A dor precisa provocar em nós a oportunidade de ver, de refletir e entender que viver é sentir. A reflexão parece mórbida, e pensar em aprendizado, soa como loucura, principalmente quando estamos sentindo dor. Mas para quem descobriu um tumor benigno no ouvido, tudo por conta de uma dor, fato que ocorreu cominho alguns anos atrás, parar para refletir sobre o que aconteceu, faz todo o sentido.

Com a dor, eu consegui também entender um pouco o próximo e perceber que somos solitários em nosso sofrimento, pois quando algo dói, é apenas em nós e com uma intensidade que apenas quem sente, consegue quantificar. Mesmo que você já tenha passado pela mesma situação que alguém passou, o momento de dor (e alegria) é sempre único, pois em cada um sente com uma intensidade. Seja a felicidade, a dor ou a satisfação.

Entender o próximo é um grande desafio, nem tudo o que vemos, nós concordamos, justamente por não termos contato com aquela situação. A dor, nos faz capaz de perceber e entender, e com isso sermos mais empáticos com os nossos semelhantes.

Por fim, a dor mostra a nossa fragilidade e também como o sentir é único, é um momento solitário e reflexivo, pelo menos para quem sabe aproveitar a situação.

O meu momento de sofrimento neste tempo difícil, me permitiu ver e perceber que a dor, a dúvida e o caos, me faz olhar mais e perceber lições que em tempos bons eu nunca iria aprender por justamente não conseguir perceber.

A vida estável e o conforto muitas vezes nos tiram a visão, mas a dor abre os nossos olhos!

 BIBLIOGRAFIA

BONDER, Nilton, A arte de se salvar: Ensinamento judaicos sobre o limite do fim e da tristeza, Editora Rocco, Rio de Janeiro, 2011.

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